quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Esperança


Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...


Texto extraído do livro "Nova Antologia Poética" de Mário Quintana, Editora Globo - São Paulo, 1998, pág. 118.

domingo, 22 de novembro de 2009

A Rosa e o Colibri


Aquela rosa era ainda um pequeno botão quando começou a notar o colibri que todos os dias voava pelo jardim em busca de alimento. Ela ficava maravilhada com a emergia daquele bichinho, com a magia do seu vôo e com suas paradas no ar. Para ela, ele era um ser sobrenatural, um semi-deus, uma fonte de beleza e alegria. Os momentos em que ele voava pelo jardim eram para ela os mais felizes do dia; ficava triste quando ele ia embora, restando-lhe apenas o consolo que ele voltaria no dia seguinte.
O tempo não para e aquele botãozinho foi desabrochando, tornando-se uma rosa adolescente cheia de vida e cor. Com a adolescência chegou também o amor; a pequena rosa apaixonou-se perdidamente pelo colibri. Aquele sapeca que era tão volúvel e que fazia charme para todas as outras flores do jardim. Ele era mesmo um exibido... não parava um instante sequer. Rodopiava entre as flores sem descanso, beijava-as de leve, quase sem tocá-las e, num segundo, já estava longe, não dando tempo nem para que elas o vissem direito.
A rosinha ficava lá no seu cantinho, entre as folhas, a espiá-lo extasiada. Seu coraçãozinho batia descompassado quando começava a ouvir o pipilar ou o som estranho do seu bater de asas. O colobri nem notava sua presença. Não percebia seu tremor, sua emoção. Passava por ela sem vê-la, tão pequenina, com pouca intensidade de cor, continuava seu vôo louco pelo jardim; ela não desanimava, sabia que amanhã ele voltaria e que o veria novamente.
Certa manhã a rosinha percebeu algo diferente. O jardim estava mais perfumado, o sol brilhava mais para ela e até as outras flores pareciam olhá-la de forma diferente. Ela mesma sentia algo diferente... não sabia bem o que era... se sentia mais feliz, mais segura, maior... Parecia que as folhas da roseira haviam se afastado, aberto um caminho para ela passar. De repente, seu coração deu um salto. Viu o colibri lá longe, vindo em direção ao seu jardim. Estava mais emocionada do que nos outros dias... suas pétalas tremiam tanto que as gotas de orvalho que nelas tinham se acumulado durante a noite iam caindo, uma a uma, como uma chuva.
Ao chegar, o irriquieto colibri não a viu de imediato, mas sentiu o doce e diferente perfume que havia no ar. Aquele perfume começou a embriagá-lo e ele, ainda mais agitado, começou a procurar de onde vinha. Foi quando deparou com a mais linda visão que já tivera em sua vida: num canto do jardim estava, entre uma cortina de folhas, a mais bela rosa. Ela era linda! Suas pétalas eram viçosas, acetinadas, de um vermelho tão vivo que pareciam de veludo salpicado de pó de estrelas brilhantes!
O colibri ficou parado no ar, quase sem respirar, com medo de que a visão desaparecesse. Aquele perfume suave, doce e inebriante vinha dela; ele não conseguia sair do lugar, estava hipnotizado por tanta beleza, por tanta luz. Aquela rosa sorria para ele e dela vinham cálidas ondas de amor que o atingiram no coração.
O passarinho foi chegando pertinho, pertinho da rosa que também estava maravilhada. Nunca o tinha visto não perto... sua penugem era azul e prateada, brilhava muito refletindo o sol que os aquecia; seus olhos pretos a fitavam e transmitiam muita emoção. Entre os dois formou-se um elo de amor infinito, sem palavras, sem trovas, sem suspiros... não havia nada a ser dito, tudo devia apenas ser sentido, e eles sentiram o quanto se amavam. Perderam-se no tempo, olhos marejados, mergulhados um no outro.
Naquele momento o colibri esqueceu-se de que aquilo não devia acontecer. Não lembrou que poderia sofrer muito. Não lembrou de tudo que aprendera: não deveria se apaixonar por uma flor, pois estas tinham uma vida muito breve e eram muito frágeis. Uma tesoura ou um vento forte poderiam levá-la para longe.
Depois daquela manhã a vida do colibri se tornou um carrossel... a noite ficava infeliz temendo que ela não estivesse lá no dia seguinte; acordava antes do sol nascer e ficava esperando clarear um pouco para que pudesse voar para junto de sua amada. Ficava o dia inteiro naquele jardim. Amavam-se loucamente... sabiam que fatalmente seriam separados; trocavam beijos apaixonados... a rosa lhe dava seu néctar, seu perfume e sua melhor cor. Eram muito felizes e seriam muito felizes enquanto pudessem... seriam infinitamente felizes.
Certa manhã quando chegou ao jardim, o colibri encontrou sua rosa no chão. Estava um pouco murcha, com algumas pétalas rasgadas, mas continuava linda, perfumada, ainda o amava e muito. Ele a pegou delicadamente com o bico; suas lágrimas caiam suavemente sobre as pétalas e com isso elas ficavam frescas e úmidas novamente e então ela começou a lhe falar.
Pediu-lhe que não se desesperasse, que não se impressionasse com tudo o que aprendera sobre as flores. Ela não morreria; apenas passaria para outro estágio. Em suas entranhas estavam suas semente, sua alma, seu espírito e estes nunca deixariam de amá-lo. Ele só teria que levá-la para uma terra fofa e deixá-la descansar por algum tempo. Depois tudo seria bom novamente.
O colibri não acreditou nela, mas para não fazê-la sofrer, concordava com tudo o que ela dizia. Levou-a para o canto mais lindo do jardim e ficou junto dela, até que secou completamente e só então se foi. Já era noite, ele se sentia vazio e triste... era como se uma parte sua tivesse ido embora com a rosa.
O passarinho passou meses em sua casa numa árvore. Não tinha ânimo para nada... deixou até de voar pelos jardins. Um dia resolveu ir até o jardim de sua rosa, para recordar, pensar nela, senti-la ainda mais próxima; voou de cabeça baixa, olhos distantes e quando chegou ao jardim, algo aconteceu:
Sentiu o perfume inesquecível de sua rosa. Voou como uma flecha até o local em que a havia deixado. De longe já vinha procurando aquele vermelho lindo, porém só conseguia ver as folhas de uma roseira nova; sua rosa não estava lá, mas ele sentia deu perfume, tinha certeza! Então a esperança voltou ao seu coraçãozinho... talvez sua rosa tivesse razão. Ele começou a reviver, dar vôos malucos pelo jardim e a voltar, todos os dias àquela roseira.
Na primavera seguinte começou a brotar da roseira um botãozinho feio, descolorido, escondido entre as folhas... e a história se repetiu...
Primeiro a rosinha o viu.... depois o colibri a viu... então compreendeu que ela tinha razão. A cada primavera eles se amam muito, se abastecem de carinho, de esperança, de energia e marcam um reencontro, pois o verdadeiro amor não morre nunca; revive a cada reencontro, a cada lembrança, a cada momento de saudade, afinal, o amor e a vida são eternos... infinitos...
Conto de Dorinha Sant’Anna

sábado, 3 de outubro de 2009

Desejo


Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.

Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.

Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes,
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.

E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.
Desejo depois que você seja útil,

Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.

Desejo ainda que você seja tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.

Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.

Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.

Desejo que você descubra,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.

Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.

Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.

Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga “Isso é meu”,
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.

Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.

Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.
E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar.

(Victor Hugo)

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Brincar de Viver




Quem me chamou
Quem vai querer voltar pro ninho
E redescobrir seu lugar

Pra retornar
E enfrentar o dia-a-dia
Reaprender a sonhar

Você verá que é mesmo assim, que a história não tem fim
Continua sempre que você responde sim à sua imaginação
A arte de sorrir cada vez que o mundo diz não

Você verá que a emoção começa agora
Agora é brincar de viver
E não esquecer, ninguém é o centro do universo
Que assim é maior o prazer

Você verá que é mesmo assim, que a história não tem fim
Continua sempre que você responde sim à sua imaginação
A arte de sorrir cada vez que o mundo diz não

E eu desejo amar todos que eu cruzar pelo meu caminho
Como eu sou feliz, eu quero ver feliz
Quem andar comigo, vem

Você verá que é mesmo assim, que a história não tem fim
Continua sempre que você responde sim à sua imaginação
A arte de sorrir cada vez que o mundo diz não.


(Música Brincar de Viver - Guilherme Arantes)

sábado, 1 de agosto de 2009

Sorria



Sorria, embora seu coração esteja doendo
Sorria, mesmo que ele esteja partido
Quando há nuvens no céu
Você sobreviverá...

Se você apenas sorri
Com seu medo e tristeza
Sorria e talvez amanhã

Você descobrirá que a vida ainda vale a pena se você apenas...

Ilumine sua face com alegria
Esconda todo rastro de tristeza
Embora uma lágrima possa estar tão próxima
Este é o momento que você tem que continuar tentando
Sorria, pra que serve o choro?

Você descobrirá que a vida ainda vale a pena
Se você apenas...
Se você sorri

Com seu medo e tristeza
Sorriso e talvez amanhã
Você descobrirá que a vida ainda vale a pena
Se você apenas sorrir...

Este é o momento que você tem que continuar tentando
Sorria, pra que serve o choro
Você descobrirá que a vida ainda vale a pena
Se você apenas sorrir

(A letra da canção "Smile", foi composta por John Turner e Geoffrey Parsons em 1954. Apenas a melodia foi composta por Charles Chaplin para o filme Tempos Modernos em 1936)

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Vida



"A vida é maravilhosa, mesmo quando dolorida. Eu gostaria que na correria da época atual a gente pudesse se permitir, criar, uma pequena ilha de contemplação, de autocontemplação, de onde se pudesse ver melhor todas as coisas: com mais generosidade, mais otimismo, mais respeito, mais silêncio, mais prazer. Mais senso da própria dignidade, não importando idade, dinheiro, cor, posição, crença. Não importando nada." (Lya Luft)


quinta-feira, 11 de junho de 2009

Desiderata


"Siga placidamente por entre o ruído e a pressa e lembre-se da paz que pode haver no silêncio. Tanto quanto possível, sem sacrificar seus princípios, conviva bem com todas as pessoas. Diga sua verdade serena e claramente e ouça os outros, mesmo os estúpidos e ignorantes, pois eles também têm sua história.

Evite as pessoas vulgares e agressivas, elas atentam contra o espírito. Se você se comparar com os outros, pode se tornar vaidoso ou amargo, porque sempre existirão pessoas piores ou melhores que você. Usufrua suas conquistas, assim como seus planos.

Mantenha o interesse pela sua profissão, por mais humilde que seja. Ela é um bem verdadeiro na sorte inconstante dos tempos. Tenha cautela em seus negócios, pois o mundo está cheio de traições. Mas não deixe isso cegá-lo para a virtude que existe. Muitos lutam por ideais nobres e por toda a parte a vida está cheia de heroísmo. Seja você mesmo. Sobretudo, não finja afeições.

Não seja cínico sobre o amor. Patrocine esta palavra, porque, apesar de toda aridez e desencanto, ele é tão perene quanto a relva. Aceite com brandura a lição dos anos, abrindo mão de bom grado das coisas da juventude. Alimente a força do espírito para ter proteção em um súbito infortúnio. Mas não se torture com fantasias.

Muitos medos nascem da solidão e do cansaço. Adote uma disciplina sadia, mas não seja exigente demais. Seja gentil com você mesmo. Você é filho do universo, assim como as árvores e as estrelas: você tem o direito de estar aqui. E mesmo que não lhe pareça claro, o universo, com certeza, está evoluindo como deveria.

Portanto, esteja em paz com Deus, não importa como você O conceba. E, quaisquer que sejam suas lutas e aspirações no ruidoso tumulto da vida, mantenha a paz em sua alma. Apesar de todas as falsidades, maldades e sonhos desfeitos, este ainda é um belo mundo. Alegre-se. Lute pela sua felicidade."

(Escrito por Max Ehrmann em 1927)

Desiderata, palavra que vem do latim "Desideratu" e significa "Aquilo que se deseja, aspiração".

sábado, 30 de maio de 2009

Viver Despenteia

Hoje aprendi que é preciso deixar que a vida te despenteie, por isso decidi aproveitar a vida com mais intensidade…
O mundo é louco, definitivamente louco…
O que é gostoso, engorda.
O que é lindo, custa caro.
O sol que ilumina o teu rosto enruga.
E o que é realmente bom dessa vida, despenteia…
— Fazer amor, despenteia.
— Rir às gargalhadas, despenteia.
— Viajar, voar, correr, entrar no mar, despenteia.
— Tirar a roupa, despenteia.
— Beijar a pessoa amada, despenteia.
— Brincar, despenteia.
— Cantar até ficar sem ar, despenteia.
— Dançar até duvidar se foi boa idéia colocar aqueles saltos gigantes essa noite, deixa seu cabelo irreconhecível…
Então, quando você me encontrar com o cabelo bagunçado… pode ter certeza que estarei passando pelo momento mais feliz da minha vida.
É a lei da vida: sempre vai estar mais despenteada a mulher que decide ir no primeiro carrinho da montanha russa, que aquela que decide não subir.
Pode ser que me sinta tentada a ser uma mulher impecável, toda arrumada por dentro e por fora, o aviso de páginas amarelas deste mundo exige boa presença:
Arrume o cabelo, coloque, tire, compre, corra, emagreça, coma coisas saudáveis, caminhe direito, fique séria… e talvez deveria seguir as instruções, mas quando vão me dar a ordem de ser feliz?
Por acaso não se dão conta que para ficar bonita eu tenho que me sentir bonita? A pessoa mais bonita que posso ser!
O único que realmente importa é que ao me olhar no espelho, veja a mulher que devo ser.
Por isso, minha recomendação a todas as pessoas:
Entregue-se...
Coma coisas gostosas,
Beije,
Abrace, dance, apaixone-se, relaxe, viaje, pule, durma tarde, acorde cedo, corra, voe, cante, arrume-se para ficar linda, arrume-se para ficar confortável.
Admire a paisagem, aproveite, e acima de tudo...
Deixe a vida te despentear!

(Autor/a Desconhecido/a)

sábado, 16 de maio de 2009

Mulher da Vida


Mulher da Vida, minha Irmã.

De todos os tempos.
De todos os povos.
De todas as latitudes.
Ela vem do fundo imemorial das idades e carrega a carga pesada dos mais torpes sinônimos, apelidos e apodos:
Mulher da zona,
Mulher da rua,
Mulher perdida,
Mulher à-toa.

Mulher da Vida, minha irmã.


Pisadas, espezinhadas, ameaçadas.
Desprotegidas e exploradas.
Ignoradas da Lei, da Justiça e do Direito.
Necessárias fisiologicamente.
Indestrutíveis.
Sobreviventes.
Possuídas e infamadas sempre por aqueles que um dia as lançaram na vida.
Marcadas.
Contaminadas,
Escorchadas.
Discriminadas.
Nenhum direito lhes assiste.

Nenhum estatuto ou norma as protege.
Sobrevivem como erva cativa dos caminhos, pisadas, maltratadas e renascidas.
Flor sombria, sementeira espinhal gerada nos viveiros da miséria, da pobreza e do abandono, enraizada em todos os quadrantes da Terra.
Um dia, numa cidade longínqua, essa mulher corria perseguida pelos homens que a tinham maculado. Aflita, ouvindo o tropel dos perseguidores e o sibilo das pedras, ela encontrou-se com a Justiça.
A Justiça estendeu sua destra poderosa e lançou o repto milenar: “Aquele que estiver sem pecado atire a primeira pedra”.
As pedras caíram e os cobradores deram as costas.
O Justo falou então a palavra de eqüidade:

“Ninguém te condenou, mulher... nem eu te condeno”.
A Justiça pesou a falta pelo peso do sacrifício e este excedeu àquela.

Vilipendiada, esmagada.
Possuída e enxovalhada, ela é a muralha que há milênios detém as urgências brutais do homem para que na sociedade possam coexistir a inocência, a castidade e a virtude.
Na fragilidade de sua carne maculada esbarra a exigência impiedosa do macho.
Sem cobertura de leis e sem proteção legal, ela atravessa a vida ultrajada e imprescindível, pisoteada, explorada, nem a sociedade a dispensa nem lhe reconhece direitos nem lhe dá proteção. E quem já alcançou o ideal dessa mulher, que um homem a tome pela mão, a levante, e diga: minha companheira.

Mulher da Vida, minha irmã.

No fim dos tempos.
No dia da Grande Justiça do Grande Juiz.
Serás remida e lavada de toda condenação.
E o juiz da Grande Justiça a vestirá de branco em novo batismo de purificação.

Limpará as máculas de sua vida humilhada e sacrificada para que a Família Humana possa subsistir sempre, estrutura sólida e indestrurível da sociedade, de todos os povos, de todos os tempos.

Mulher da Vida, minha irmã.

(Cora Coralina)

sábado, 9 de maio de 2009

Dá pra escolher

No interessante livro HOMEM LENTO, de J.M. Coetzee, há uma passagem que me marcou. É um confronto verbal entre o personagem principal do livro, um homem de mais de 60 anos que teve uma perna amputada depois de um acidente de bicicleta, e um garoto adolescente. Ambos estão no sombrio e decadente aparatamento do velho, que resmunga: "Eu fui ultrapassado pelo tempo. Este apartamento e tudo o que existe dentro dele foi ultrapassado pelo tempo". O garoto pergunta se ele não gosta de coisas novas. O velho (que nem é tão velho) responde: "Isso tudo um dia foi novo. Tudo no mundo um dia foi novo. Até eu fui novo. Na hora em que nasci, eu era a coisa mais moderna da face da terra".

Nada é tão moderno quanto nós ao nascermos. Sublinhei.

Prosseguindo o diálogo, o garoto então comenta, como quem não quer nada, que um dia foi visitar o avô para mostrar como funcionava um computador. O avô era bem velho e também tinha sido ultrapassado pelo tempo. Hoje fazia compras pela internet, enviava e-mails, recebia fotos."E daí?", pergunta o mal-humorado sem perna.

"Daí que dá pra escolher".

Eis uma frase, uma verdade, um verso: dá pra escolher.

Todo dia, ao levantar da cama, eu procuro me lembrar: dá pra escolher.

Nem eu nem você estamos jogados ao léu, nas mãos do destino.

Não temos controle sobre tudo, mas dá pra escolher entre ter amigos ou viver recluso, dá pra escolher entre privilegiar um amor ou ter vários casos superficiais, dá pra escolher entre participar ativamente de um projeto que alavanque nosso bem-estar ou ficar de fora apenas criticando, dá pra escolher entre se refugiar num lugar tranqüilo ou aprender a lidar com o stress urbano, dá pra escolher entre levar a vida com bom-humor ou levar a vida na ponta da faca.

Tudo é uma escolha, inclusive ser velho ou ser jovem, e isto não se resolve apenas numa clínica de estética. Todas as nossas escolhas passam pelo estado de espírito. É ele que vai determinar se vamos viver uma vida mais simples ou mais complicada, mais solitária ou mais social, mais produtiva ou mais lerda.

Dá pra escolher entre ser carnívoro ou vegetariano, entre fumar ou não, entre correr na praia ou ficar um pouco mais na cama, entre jogar paciência ou ler um livro, entre amores serenos ou amores turbulentos.Se a escolha será acertada, aí já é outro assunto, o futuro vai dizer.

Pensando bem, acertos e erros nem estão em pauta aqui. O que importa é ter consciência de que ficar sentado esperando que a vida escolha por nós não é uma opção confortável como parece.

Descansados da Silva, vem o tempo e crau: nos ultrapassa.

(Martha Medeiros)

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Existência e Vida


Existir não viver:
É, apenas, estar na vida,
Sem dela participar,
Como o fruto não colhido
Putrefeito no ramo
Sem cumprir seu destino
Como a flor, no caule fenecida,
Cujo perfume a brisa leva
Inebriando evanescentes, sonhos
De estrelas cadentes.
Existir não viver:
É como a nave à deriva
Que não navega, flutua apenas,
Porque não tem rumo, destino,
Porto de encontro de saudades.
Ventos não traçam rumos
E ondas não têm estradas.
Viver é ser protagonista,
Existir apenas espectador
No labirinto da vida
Existir é não buscar a saída,
Viver é encontrá-la
E abri-la com a chave do amor.

(Osmar Nicolau Lucca - Publicado em Zero Hora em 04/05/2009)

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Explosões


Não tenho nada a ver com explosões”, diz um verso de Sylvia Plath. Eu li como se tivesse sido escrito por mim. Também não faço muito barulho, ainda que seja no silêncio que nos arrebentamos.

Tampouco tenho a ver com o espaço sideral, com galáxias ou mesmo com estrelas. Preciso estar firmemente pousada sobre algo — ou alguém. Abraços me seguram. E eu me agarro. Tenho medo da falta de gravidade: solta demais me perco, não vôo senão em sonhos.

Não tenho nada a ver com o mato, com o meio da selva, com raízes que brotam do chão e me fazem tropeçar, cair com o rosto sobre folhas e gravetos feito uma fugitiva dos contos de fada, a saia rasgando pelo caminho, a sensação de ser perseguida. Não tenho nada a ver com cipós, troncos, ruídos que não sei de onde vêm e o que me dizem. Não me sinto à vontade onde o sol tem dificuldade de entrar. Prefiro praia, campo aberto, horizonte, espaço pra correr em linha reta. Ou para permanecer sem susto.

Não tenho nada a ver com boate, com o som alto impedindo a voz, com a sensualidade comprada em shopping, com o ajuntamento que é pura distância, as horas mortas desgastando o rosto, a falsa alegria dos ausentes de si mesmos.

Não tenho nada a ver com o que é dos outros, sejam roupas, gostos, opiniões ou irmãos, não me escalo para histórias que não são minhas, não me envolvo com o que não me envolve, não tomo emprestado nem me empresto. Se é caso sério eu me dôo, se é bobagem eu me abstenho, tenho vida própria e suficiente pra lidar, sobra pouco de mim para intromissões no que me é ainda mais estranho do que eu mesma.

Não tenho nada a ver com cenas de comerciais de TV, sou um filme sueco, uma comédia britânica, um erro de adaptação, um personagem que esquece a fala, nada possuo de floral ou carnaval, não aprendi a ser festiva, sou apenas fácil.

Não tenho nada a ver com igrejas, rezas e penitências, são raros os padres com firmeza no tom, é sempre uma fragilidade oral, um pedido de desculpas em nome de todos, frases que só parecem ter vogais, nosso sentimento de culpa recolhido como um dízimo. Nada tenho a ver com não gostar de mim. Me aceito impura, me gosto com pecados, e há muito me perdoei.

Não tenho nada a ver com galáxia, mato, boate, a vida dos outros, os comerciais de TV e igrejas. Meu mundo se resume a palavras que me perfuram, a canções que me comovem, a paixões que já nem lembro, a perguntas sem respostas, a respostas que não me servem, à constante perseguição do que ainda não sei. Meu mundo se resume ao encontro do que é terra e fogo dentro de mim, onde não me enxergo, mas me sinto.

Minto, tenho tudo a ver com explosões.

(Martha Medeiros)

domingo, 15 de março de 2009

Viver ultrapassa todo o entendimento



"Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é possível fazer sentido.
Eu não: quero é uma verdade inventada.
(Clarice Lispector)

domingo, 8 de março de 2009

Amanhã pode ser muito tarde


Não deixe para amanhã
Amanhã pode ser muito tarde
Para você dizer que ama,
Para você dizer que perdoa,
Para você dizer que desculpa,

Amanhã pode ser muito tarde
Para você pedir perdão,
Para você dizer:
Desculpe-me, o erro foi meu!...
O seu amor, amanhã, pode já ser inútil;
O seu perdão, amanhã, pode já não ser preciso;
A sua volta, amanhã, pode já não ser esperada;
A sua carta, amanhã, pode já não ser lida;
O seu carinho, amanhã, pode já não ser mais necessário;
O seu abraço, amanhã, pode já não encontrar outros braços...
Porque amanhã pode ser muito... muito tarde!

Não deixe para amanhã para dizer: Eu amo você!
Estou com saudades de você!
Perdoe-me!
Desculpe-me!
Esta flor é para você!
Você está tão bem!...

Não deixe para amanhã
O seu sorriso,
O seu abraço,
O seu carinho,
O seu trabalho,
O seu sonho,
A sua ajuda...

Não deixe para amanhã para perguntar:
Por que você está triste?
O que há com você?
Ei!... Venha cá, vamos conversar...
Cadê o seu sorriso?
Ainda tenho chance?...
Já percebeu que eu existo?
Por que não começamos de novo?
Estou com você.
Sabe que pode contar comigo?
Cadê os seus sonhos?
Onde está a sua garra?...

Lembre-se:
Amanhã pode ser tarde... muito tarde!
Procure.
Vá atrás!
Insista!
Tente mais uma vez!
Só hoje é definitivo!
Amanhã pode ser tarde... muito tarde!

(Autor/a Desconhecido/a)

Mulherão

Peça para um homem descrever um mulherão. Ele imediatamente vai falar no tamanho dos seios, na medida da cintura, no volume dos lábios, nas pernas, bumbum e cor dos olhos. Ou vai dizer que mulherão tem que ser loira, 1,80m, siliconada, sorriso colgate.
Mulherões, dentro desse conceito, não existem muitas: Vera Fischer, Malu Mader, Letícia Spiller, Adriane Galisteu, Lumas e Brunas.
Agora pergunte para uma mulher o que ela considera um mulherão e você vai descobrir que tem uma em cada esquina.
Mulherão é aquela que pega dois ônibus para ir para o trabalho e mais dois para voltar, e quando chega em casa encontra um tanque lotado de roupa e uma família morta de fome.
Mulherão é aquela que vai de madrugada para a fila garantir matrícula na escola e aquela aposentada que passa horas em pé na fila do banco para buscar uma pensão de 100 reais.
Mulherão é a empresária que administra dezenas de funcionários de segunda a sexta, e uma família todos os dias da semana.
Mulherão é quem volta do supermercado segurando várias sacolas depois de ter pesquisado preços e feito malabarismo com o orçamento.
Mulherão é aquela que se depila, que passa cremes, que se maquia, que faz dieta, que malha, que usa salto alto, meia-calça, ajeita o cabelo e se perfuma, mesmo sem nenhum convite para ser capa de revista.
Mulherão é quem leva os filhos na escola, busca os filhos na escola, leva os filhos na natação, busca os filhos na natação, leva os filhos para cama, conta histórias, dá um beijo e apaga a luz.
Mulherão é aquela mãe de adolescente que não dorme enquanto ele não chega, é quem de manhã bem cedo já está de pé, esquentando o leite.
Mulherão é quem leciona em troca de um salário mínimo, é quem faz serviços voluntários, é quem colhe uva, é quem opera pacientes, é quem lava a roupa para fora, é quem bota a mesa, cozinha o feijão e à tarde trabalha atrás de um balcão.
Mulherão é quem cria os filhos sozinha, quem dá expediente de 8 horas e enfrenta menopausa, TPM e menstruação. Mulherão é quem arruma os armários, coloca flores nos vasos, fecha a cortina para o sol não desbotar os móveis, mantém a geladeira cheia e os cinzeiros vazios. Mulherão é quem sabe onde cada coisa está, o que cada filho sente e qual o melhor remédio para azia.
Lumas, Brunas, Carlas, Luanas e Sheilas: mulheres nota 10 no quesito lindas de morrer, mas mulherão é quem mata um leão por dia.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Canção das Mulheres




Que o outro saiba quando estou com medo, e me tome nos braços sem fazer perguntas demais.
Que o outro note quando preciso de silêncio e não vá embora batendo a porta, mas entenda que não o amarei menos porque estou quieta.
Que o outro aceite que me preocupo com ele e não se irrite com minha solicitude, e se ela for excessiva saiba me dizer isso com delicadeza ou bom humor.
Que o outro perceba minha fragilidade e não ria de mim, nem se aproveite disso.
Que se eu faço uma bobagem o outro goste um pouco mais de mim, porque também preciso poder fazer tolices tantas vezes.
Que se estou apenas cansada o outro não pense logo que estou nervosa, ou doente, ou agressiva, nem diga que reclamo demais.
Que o outro sinta quanto me dóia idéia da perda, e ouse ficar comigo um pouco - em lugar de voltar logo à sua vida.
Que se estou numa fase ruim o outro seja meu cúmplice, mas sem fazer alarde nem dizendo ''Olha que estou tendo muita paciência com você!
'Que quando sem querer eu digo uma coisa bem inadequada diante de mais pessoas, o outro não me exponha nem me ridicularize.
Que se eventualmente perco a paciência, perco a graça e perco a compostura, o outro ainda assim me ache linda e me admire.
Que o outro não me considere sempre disponível, sempre necessariamente compreensiva, mas me aceite quando não estou podendo ser nada disso.
Que, finalmente, o outro entenda que mesmo se às vezes me esforço, não sou, nem devo ser, a mulher-maravilha, mas apenas uma pessoa: vulnerável e forte, incapaz e gloriosa, assustada e audaciosa - uma mulher.
(Lya Luft)

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Mulheres Possíveis



“Eu não sirvo de exemplo para nada, mas, se você quer saber se isso é possível, me ofereço como piloto de testes.
Sou a Miss Imperfeita, muito prazer.
Uma imperfeita que faz tudo o que precisa fazer, como boa profissional, mãe e mulher que também sou:
Trabalho todos os dias, ganho minha grana, vou ao supermercado três vezes por semana, decido o cardápio das refeições, levo os filhos no colégio e busco, almoço com eles, estudo com eles, telefono para minha mãe todas as noites, procuro minhas amigas, namoro, viajo, vou ao cinema, pago minhas contas, respondo a toneladas de e-mails, faço revisões no dentista, mamografia, caminho meia hora diariamente, compro flores para casa, providencio os consertos domésticos, participo de eventos e reuniões ligados à minha profissão e ainda faço escova toda semana - e as unhas!
E, entre uma coisa e outra, leio livros.
Portanto, sou ocupada, mas não uma workaholic.
Por mais disciplinada e responsável que eu seja, aprendi duas coisinhas que operam milagres.
Primeiro: a dizer NÃO.
Segundo: a não sentir um pingo de culpa por dizer NÃO. Culpa por nada, aliás.
Existe a Coca Zero, o Fome Zero, o Recruta Zero. Pois inclua na sua lista a Culpa Zero.
Quando você nasceu, nenhum profeta adentrou a sala da maternidade e lhe apontou o dedo dizendo que a partir daquele momento você seria modelo para os outros.
Seu pai e sua mãe, acredite, não tiveram essa expectativa: tudo o que desejaram é que você não chorasse muito durante as madrugadas e mamasse direitinho. Você não é Nossa Senhora. Você é, humildemente, uma mulher. E, se não aprender a delegar, a priorizar e a se divertir, bye-bye vida interessante.
Porque vida interessante não é ter a agenda lotada, não é ser sempre politicamente correta, não é topar qualquer projeto por dinheiro, não é atender a todos e criar para si a falsa impressão de ser indispensável. É ter tempo.
Tempo para fazer nada. Tempo para fazer tudo. Tempo para dançar sozinha na sala. Tempo para bisbilhotar uma loja de discos. Tempo para sumir dois dias com seu amor. Três dias. Cinco dias! Tempo para uma massagem. Tempo para ver a novela. Tempo para receber aquela sua amiga que é consultora de produtos de beleza. Tempo para fazer um trabalho voluntário. Tempo para procurar um abajur novo para seu quarto. Tempo para conhecer outras pessoas. Voltar a estudar. Para engravidar. Tempo para escrever um livro que você nem sabe se um dia será editado. Tempo, principalmente, para descobrir que você pode ser perfeitamente organizada e profissional sem deixar de existir.
Porque nossa existência não é contabilizada por um relógio de ponto ou pela quantidade de memorandos virtuais que atolam nossa caixa postal.
Existir, a que será que se destina?
Destina-se a ter o tempo a favor, e não contra.
A mulher moderna anda muito antiga. Acredita que, se não for super, se não for mega, se não for uma executiva ISO 9000, não será bem avaliada. Está tentando provar não-sei-o-quê para não-sei-quem. Precisa respeitar o mosaico de si mesma, privilegiar cada pedacinho de si. Se o trabalho é um pedação de sua vida, ótimo! Nada é mais elegante, charmoso e inteligente do que ser independente.
Mulher que se sustenta fica muito mais sexy e muito mais livre para ir e vir. Desde que lembre de separar alguns bons momentos da semana para usufruir essa independência, senão é escravidão, a mesma que nos mantinha trancafiadas em casa, espiando a vida pela janela. Desacelerar tem um custo.
Talvez seja preciso esquecer a bolsa Prada, o hotel decorado pelo Philippe Starck e o batom da M.A.C.. Mas, se você precisa vender a alma ao diabo para ter tudo isso, francamente, está precisando rever seus valores. E descobrir que uma bolsa de palha, uma pousadinha rústica à beira-mar e o rosto lavado (ok, esqueça o rosto lavado) podem ser prazeres cinco estrelas e nos dar uma nova perspectiva sobre o que é, afinal, uma vida interessante.”
(MARTHA MEDEIROS - Revista do Jornal O GLOBO)

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Sou...


Sou a núvem que choveu
O pássaro que perdeu as penas
A onda que quebou na praia
Sou
Metade de mim
Posto ser completo, só o sou ao teu lado
Sou a simples flor, de singelo existir
Sou as pás do moínho sem o vento
Sou a força não controlada pelo pensamento
Sou
Ou fui
Não sei...

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Paciência



Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma
A vida não pára...

Enquanto o tempo
Acelera e pede pressa
Eu me recuso faço hora
Vou na valsa
A vida é tão rara...

Enquanto todo mundo
Espera a cura do mal
E a loucura finge
Que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência...

O mundo vai girando
Cada vez mais veloz
A gente espera do mundo
E o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência...

Será que é tempo
Que lhe falta prá perceber?
Será que temos esse tempo
Prá perder?
E quem quer saber?
A vida é tão rara
Tão rara...

Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma
Eu sei, a vida não pára
A vida não pára não...

Será que é tempo
Que lhe falta prá perceber?
Será que temos esse tempo
Prá perder?
E quem quer saber?
A vida é tão rara
Tão rara...

Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma
Eu sei, a vida não pára
A vida não pára não...
A vida não pára!...
A vida é tão rara!...

(Lenine e Dudu Falcão)

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

O Medo de Amar




Medo de amar? Parece absurdo, com tantos outros medos que temos que enfrentar: medo da violência, medo da inadimplência, e a não menos temida solidão, que é o que nos faz buscar relacionamentos. Mas absurdo ou não, o medo de amar se instala entre as nossas vértebras e a gente sabe por quê.
O amor, tão nobre, tão denso, tão intenso, acaba. Rasga a gente por dentro, faz um corte profundo que vai do peito até a virilha, o amor se encerra bruscamente porque de repente uma terceira pessoa surgiu ou simplesmente porque não há mais interesse ou atração, sei lá, vá saber o que interrompe um sentimento, é mistério indecifrável. Mas o amor termina, mal-agradecido, termina, e termina só de um lado, nunca se encerra em dois corações ao mesmo tempo, desacelera um antes do outro, e vai um pouco de dor pra cada canto. Dói em quem tomou a iniciativa de romper, porque romper não é fácil, quebrar rotinas é sempre traumático. Além do amor existe a amizade que permanece e a presença com que se acostuma, romper um amor não é bobagem, é fato de grande responsabilidade, é uma ferida que se abre no corpo do outro, no afeto do outro, e em si próprio, ainda que com menos gravidade.
E ter o amor rejeitado, nem se fala, é fratura exposta, definhamos em público, encolhemos a alma, quase desejamos uma violência qualquer vinda da rua para esquecermos dessa violência vinda do tempo gasto e vivido, esse assalto em que nos roubaram tudo, o amor e o que vem com ele, confiança e estabilidade. Sem o amor, nada resta, a crença se desfaz, o romantismo perde o sentido, músicas idiotas nos fazem chorar dentro do carro.
Passa a dor do amor, vem a trégua, o coração limpo de novo, os olhos novamente secos, a boca vazia. Nada de bom está acontecendo, mas também nada de ruim. Um novo amor? Nem pensar. Medo, respondemos.
Que corajosos somos nós, que apesar de um medo tão justificado, amamos outra vez e todas as vezes que o amor nos chama, fingindo um pouco de resistência mas sabendo que para sempre é impossível recusá-lo.
(Martha Medeiros)

Sempre Não é Todo Dia


Eu hoje acordei tão só
Mais só do que eu merecia
Olhei pro meu espelho e "rá!"
Gritei o que eu mais queria
Na fresta da minha janela
Raiou, vazou a luz do dia
Entrou sem me pedir licença
Querendo me servir de guia
E eu que já sabia tudo
Das rotas da Astrologia
Dancei, e a cabeça tonta
O meu reinado não previa
Olhei pro meu espelho e "rá!"
Meu grito não me convencia
Princesa eu sei que sou pra sempre
Mas sempre não é todo dia
Botei o meu nariz a postos
Pro faro e pro que vicia
Senti teu cheiro na semente
Que a manhã me oferecia
Olhei pro meu espelho e "rá!"
Meu grito não me convencia
Princesa eu sei que sou pra sempre
Mas sempre não é todo dia
Eu hoje acordei tão só
Mais só do que eu merecia
E eu acho que será pra sempre
Mas sempre não é todo dia

(Oswaldo Montenegro)

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Solidão Por Chico Buarque de Holanda



Solidão não é a falta de gente para conversar, namorar, passear ou fazer sexo...
Isto é carência.

Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar...
Isto é saudade.

Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe, às vezes, para realinhar os pensamentos...
Isto é equilíbrio.

Solidão não é o claustro involuntário que o destino nos impõe compulsoriamente para que revejamos a nossa vida...
Isto é um princípio da natureza.

Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado...
Isto é circunstância.

Solidão é muito mais do que isto.
Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma.

(Francisco Buarque de Holanda)

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Suave é viver só



Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

(Fernando Pessoa - Odes de Ricardo Reis)


domingo, 25 de janeiro de 2009

Cançao Desse Rumor














Quem - estando ausente - entra no quarto
Quem deita ao lado meu, quem passa
No meu coração seus lábios quentes, quem
Desperta em mim as feras todas
Quem me rasga e cura
Quem me atrai?
Quem murmura na treva e acende estrelas
Quem me leva em marés de sono e riso
Quem invade meu dia após a noite
Quem vem – estando ausente -
E nunca vai?
(Lya Luft)

Saudade



Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...


Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...


Saudade é sentir que existe o que não existe mais...

Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...


Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.


E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.


O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.

(Pablo Neruda)

sábado, 10 de janeiro de 2009

Gardênia

A Gardênia é o símbolo da graça feminina, da sutileza e do mérito artístico.*

A Gardênia (Gardenia Jasminoides) é uma planta ornamental da família das rubiáceas, também chamada de "Jasmim-do-cabo", muito conhecida no Brasil apenas como "Jasmim", embora não pertença à família dos Jasmins, muitos a chamam assim pelo seu perfume (é muito usada na perfumaria). É uma planta de origem chinesa e pode atingir até 2 metros de altura.
No início da primavera, a gardênia começa a cobrir-se de belas e perfumadas flores. O seu perfume doce e intenso já inspirou até um famoso bolero, Perfume de Gardênia, de Rafael Hernández Marín, cantor, compositor e instrumentista porto-riquenho (24 de outubro de 1892 — 11 de dezembro de 1965).
O responsável pelo nome “Gardênia” foi Carl Linnaeus, em homenagem ao médico, naturalista e botânico britânico Alexander Garden (Birse/Escócia, janeiro de 1730 – Londres, 15 de abril de 1791).
Existem cerca de 250 espécies conhecidas como gardênia, porém a mais cultivada e famosa é a Gardênia Jasminoides que, recentemente, parece ter sido reclassificada como Gardenia Augusta.
Além das flores, que sem dúvida, são o verdadeiro espectáculo da planta, a gardênia produz uma folhagem verde escuro muito bela e brilhante, com o detalhe de que as folhas não caem durante o inverno.
Propaga-se por meio de estaquia da ponta de ramos e o solo ideal é o rico em matéria orgânica (mistura recomendada: 1 parte de terra comum de jardim, 1 parte de terra vegetal e 2 partes de composto orgânico), prefere clima ameno. Quanto à luminosidade, precisa de muita luminosidade, de preferência sol pleno, mas não suporta bem o sol direto nos horários mais quentes (das 11 às 17 horas)
Quanto à poda, recomenda-se para manter o formato compacto, mas devem ser feitas sempre após a floração. Quanto às regas, durante a primavera e o verão devem ser freqüentes, mas recomenda-se não molhar as flores. A quantidade de água deve ser diminuída durante o outono e inverno. Solo encharcado prejudica a planta.
No paisagísmo, é ideal para ser usada como maciço ou formando cerca-viva, mas dá ótimos resultados também como exemplar isolado.
*(Cooper, J. C. (2007). Diccionario de símbolos. Barcelona: GG. ISBN 978-84-252-1976-4)